30.12.15

Manel Vintém e o sonho do Liverpool



- Yes, yes, let’s go, let’s go ... you are in the Stadium of Light! It’s your great opportunity! – exclamava entusiasmado Manel Vintém para os seus briosos jogadores, sedento de fazer história.

 

De sua graça Manuel Cretino Vintém, nascido há 60 anos em Vimaranis, terra fundada pelo senhor da guerra Vimara Peres, no Condado Portucalense, tentava a sua sorte em mais uma noite de pontapé na bola. Substituindo o seu fluente dialecto minhoto gerado pela sua prosápia verborreica, conhecido pelo “machadês” - uma versão vernácula do português arcaico -  pelo inglês actual, não se cansava de incitar os seus pupilos de forma a cometer uma proeza inédita que consistia em vencer o Glorioso colosso das camisolas berrantes no seu próprio terreno. Era algo que até à data e ao longo do seu percurso de manager futeboleiro nunca tinha conseguido.

 

Para lá desta obsessão, Manel Vintém acalentava ainda outro dos seus sonhos de criança desde que começou a afinfar uns chutos na trapeira, integrado na equipa lá do bairro. Queria, um dia, treinar o Liverpool!

Manel considerava-se um predestinado, talhado para altos e grandes vôos, quanto mais não fossem aqueles que ainda hoje duram uma hora e meia e ligam o continente português com a ilha da Madeira.

 

Com um percurso repleto de êxitos desportivos, rumou à dita ilha, onde e após ter percorrido o íngreme acesso ao alto da Choupana, veio a confirmar as suas excelentes credenciais de um técnico muito erudito, ao nível dos melhores do Velho Continente, vencendo concludentemente por vinte vezes o Torneio do Bolo do Caco, trinta vezes a Taça da Ponta do Sol e por dez vezes os triangulares de Porto Moniz e da Camacha.

 

Desta vez a eliminatória jogava-se na Luz, um palco imortal, uma montra europeia privilegiada. Vintém não podia enjeitar esta oportunidade de ouro. Deixou ficar no balneário as suas charadas verbais e com um toque fleumático lançou-se abertamente à conquista de uma vitória épica.

Manel Vintém sonhava, sonhava…

O êxito estava ali tão perto, à distância de uns poucos de metros num relvado bem tratado, onde a bola corria sem parar!

 

Inebriado pelos extraordinários cânticos provenientes das bancadas, pareceu-lhe ouvir o “You’ll Never Walk Alone”, esse inédito ícone musical de Anfield Road.

 

A peleja corria célere para o seu final, o entusiasmo e o apoio intenso não cessavam.

Nisto, quando já nada o fazia prever, um bruaá imenso perpassou pelo estádio inteiro.

Gottardi, o keeper da equipa de Manel Vintém, ia buscar, sem apelo nem agravo, o esférico ao fundo das suas redes. Para Vintém tinha desabado mais uma vez o mundo, saindo da Luz com uma azeda derrota pela margem mínima, com o golo a ser marcado no derradeiro minuto dos noventa.

 

Ressaibiado, não resistiu, e citando de longe na direcção do seu  adversário homólogo, exclamou:

- Até parece que ganharam ao Liverpool!

 

Curiosamente, nesse momento a aparelhagem sonora do estádio emitia os primeiros acordes do hino de Anfield Road, e os adeptos Benfiquistas gritaram:

- “Glorioso, nunca caminharás sozinho!”

 

E Manel Vintém encafuado naquele ar sorumbático e idiota que o caracteriza, lá ia arengando as patacoadas de sempre, sonhando ir a caminho dos balneários do Liverpool:

- Ainda um dia hei-de treiná-lo, ainda um dia hei-de treiná-lo…

 

 

GRÃO VASCO


 

 

 

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