O
nosso imaginário de infância está recheado de belas estórias. E as fábulas,
esses contos em que os protagonistas eram animais que nós todos conhecíamos,
acrescentavam algo de muito especial à nossa criatividade e alertavam-nos para
o porvir e suas consequências de uma forma cativante e expressiva.
Quem
não se lembra, na sua escola primária de “A cigarra e a formiga”, de “A lebre e
a tartaruga” ou de “A cegonha e a raposa”, fábulas de Jean de La Fontaine,
célebre poeta e fabulista francês do século XVII?
Curiosamente,
de todas essas estórias “do tempo em que os animais falavam”, aquela que melhor
recordo pelo seu significado, é a de “A cigarra e a formiga”.
Perante
a intensa canícula de um Verão incomum, a formiga temendo uma invernia
rigorosa, procurava afanosamente amealhar mantimentos suficientes que a época
de veraneio lhe proporcionava. Era vê-la diariamente, de sol a sol, a arrastar
enormes grãos-de-milho e folhas protectoras, num esforço titânico que muitas
das vezes a deixava completamente extenuada.
Por
sua vez, a cigarra, perante um clima tão bom e tanta abundância de alimento,
esbanjava o seu tempo cantando de árvore em árvore, recostando-se na sua
cadeira de balancé, optando pela vida boémia que tanto adorava.
O
final da estória, todos o sabemos. A formiga à lareira, bem aconchegada no
conforto do lar e com a sua despensa bem recheada, enquanto lá fora, com a neve
a cair intensamente, a cigarra tiritava de frio e de fome, encostada a um
taipal, aguardando assustada por uma broncopneumonia que a levasse desta para
melhor. Desesperada, foi bater à porta da casa da formiga, implorando protecção, pão e agasalho. A formiga,
num acto de elevada solidariedade e grande compaixão, abriu-lhe a porta de sua
casa e disse-lhe:
- “Entra, minha cara
amiga. Estás agora a ver por que é que eu não aderi aos teus “grandiosos
espectáculos” de cantoria e boémia?
Moral
da estória:
- “Todas as acções têm
sempre as suas consequências”.
Na
realidade, já se passaram décadas e décadas, desde que li este conto infantil.
No entanto, por mais esquisito que pareça, ainda hoje, pelas manhãs de 2ª
feira, oiço esse intenso canto da cigarra, neste caso com uma triste nuance – a cigarra não se contém de
inveja e apouca e escarnece o soberbo e denodado trabalho da formiga.
Se
quiserem rever esta versão da fábula “A cigarra e a formiga” e ouvir o som estridente desse insecto cantante e voador, é só passarem pelo blogue “novogeraçãobenfica” todas as 2ªs feiras
e constatarem como Rui Gomes da Silva desdenha do trabalho árduo da formiga.
Mas,
meus Caros Companheiros, por mais que ele cante, o fim da história será sempre
diferente – RGS, a cigarra despeitada e vaidosa, nunca irá abocanhar nem
delapidar uma enorme riqueza e uma obra que demorou tanto tempo a construir,
com tanto sacrifício e em que a formiga demonstrando talento, capacidade de
trabalho, visão e arte transformou uma casa em frangalhos num potentado
próspero e único!
Portanto,
nesta versão, a cigarra vai mesmo ficar sentada na soleira da porta da formiga,
à espera de melhores dias, pois desta vez a formiga que tem sido tantas vezes
magnânima, não irá mais estender-lhe a mão.
Não
sei se quando chegar o próximo Verão a cigarra ainda dure para cantar outra
vez.
GRÃO VASCO